Abordagem Cirúrgica Sequencial do Queratocone I: Definição e Diagnóstico
O queratocone (QC) é uma ectasia corneana não inflamatória, geralmente bilateral e assimétrica (Fig 1). Cursa com um adelgaçamento e encurvamento progressivos induzindo um astigmatismo irregular; esta deformação sectorial da córnea localiza-se preferencialmente no quadrante infero-temporal.
Os sintomas são altamente variáveis e dependem da fase da progressão da doença. No início pode não haver sintomas, mas progride de forma insidiosa e clinicamente subtil, com distorção significativa da visão na doença avançada.
Afecta aproximadamente 1 em cada 2000 pessoas; surge geralmente na puberdade, com 75% dos casos diagnosticados antes dos 25 anos. Normalmente a progressão abranda a partir da 3ª década e a gravidade está geralmente relacionada com a precocidade do seu aparecimento. Envolve ambos os sexos e todos os grupos étnicos.
A etiologia desta patologia não está claramente esclarecida, mas existe um vínculo genético importante (10% dos casos com história familiar), a associação com o síndrome de Down (prevalência 10 a 300 vezes mais elevada) e doenças do colagénio (síndromes de Marfan e Elhers-Danlos).
Por outro lado, a associação com a atopia e a conjuntivite vernal é amplamente reconhecida e o coçar do olho (“eye rubbing”), presente em mais de um terço dos doentes, tem sido apontado como crucial na fisiopatologia desta doença.
O impacto visual desta patologia surge duma deformação localizada na córnea, que gera um desacerto na frente de onda de luz que penetra no globo ocular e progride em direcção à retina; dada a irregularidade desta frente de onda, o erro de focagem não consiste numa simples refracção de miopia ou astigmatismo regular, mas antes em aberrações ópticas de alta ordem, que, a não ser em casos leves ou incipientes, não são possíveis de compensar com óculos ou lentes de contacto hidrófilas comuns.
O diagnóstico do queratocone pode inicialmente ser levantado por queixas de dificuldade visual marcada, em idade característica, e por alterações frequentes da graduação em pouco tempo.
Existem alterações específicas observáveis no exame biomicroscópico tais como os sinais de Munson (Fig 2) e estrias de Vogt, mas os casos mais subtis podem apenas ser diagnosticados pela análise morfológica e das aberrações ópticas da córnea.
Os novos tomógrafos corneanos permitem caracterizar e detectar alterações mais precoces da paquimetria, das curvaturas e elevações, quer da superfície anterior quer da posterior da córnea e monitorizar a sua progressão através da quantificação de vários índices numéricos (Fig 3).
Por outro lado, a caracterização biomecânica da córnea com o ORA e mais recente com o Corvis ST tem também contribuído para a detecção de casos de queratocone incipiente.
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